Análise do filme O Exorcista – O Devoto (com spoilers)

Não só faltou Deus neste filme. Faltou o diabo. Faltou um exorcismo. Faltou terror.

Adicionado a 15 de outubro de 2023 por Valewson. .

Esta é a análise do Gato Preto de O Exorcista – O Devoto, um filme americano de terror lançado internacionalmente em 5 de outubro 2023, parte da franquia O Exorcista. Atenção: o texto tem spoilers!


Em 26 de dezembro de 1973, o grande clássico da literatura, obra de William Peter Blatty, foi encenado pela primeira vez nos cinemas americanos. Nascia, assim, o também clássico da dramaturgia O Exorcista. Dirigido por William Friedkin, o filme trazia um grande elenco, com Linda Blair como a menina Regan McNeil, que foi o pior pesadelo de duas gerações. Trazia, também, Ellen Burstyn, Jason Miller, Max von Sydow e um elenco de primeira categoria. Eles não pouparam despesas.

A mistura de uma narrativa interessante, com o andamento adequado, onde acompanhamos às personagens e suas vidas quotidianas, somos apresentados a um conflito familiar a todos nós, de uma mãe workaholic que ama a sua filha, mas não tem muito tempo para passar com ela, a carência de uma criança e sua curiosidade em relação à religião, brincadeiras que podem parecer inofensivas, depois vemos estes conflitos intensificando-se até sermos presos numa teia de horror psicológico, horror corporal, blasfêmias e terror sobrenatural, e vemos, finalmente, uma força maligna invisível e tremendamente mais poderosa do que todos nós. Nossas esperanças, quer sejamos cristãos ou não, são depositadas sobre o Padre Damien Karras, um psiquiatra, um homem prático que está preso à Igreja muito mais por ela ter pagado seu curso universitário em uma grande faculdade Ivy League do que pela fé. Na verdade, nós ficamos estarrecidos e aterrorizados e atemorizados porque o próprio homem que pode aliviar a tensão não tem fé. Então, Deus ex machina, somos apresentados ao padre Lancaster Merrin. A narrativa do filme nos diz que ele já havia realizado – apenas ele – um ritual de exorcismo.
É então que o Padre Merrin realiza todos os ritos e, no auge do horror, quando finalmente descobrimos o nome do demônio – Pazuzu – um nome de demônio real dos antigos livros das feiticeiras, o demônio no corpo da menina, e também testemunhamos o assassinato dos padres Merrin e Karras, que sacrificam-se para salvar a pequena Regan.

Não vemos nada disso em O Exorcista – o Devoto, o novo filme da franquia. O diretor, David Gordon Green, tenta fazer um “reboot”, como se O Exorcista 2, 3, O Início, Dominion e a malfadada série não tivessem existido. Uma pena. Afinal, depois do filme de 73, O Exorcista 3 é o melhor do gênero. Enfim, o que vemos em O Devoto é uma trama que até começa bem, mas perde o fôlego muito rápido.
A trama segue duas meninas, Angel e Katty. Angel nasce durante os terremotos de 2011, no Haiti, logo depois de sua mãe receber uma bênção de uma religião afro e, logo depois, morre no tremor. E é aí que o filme começa a deixar furos. Temos uma estória de origem realmente intrigante para Angel, mas e quanto a Katty? Ela é apenas uma menina branca e protestante genérica. Fica claro que ela está ali apenas para fazer um filme sobre um exorcismo duplo. Afinal, esta é a última fronteira: dois exorcismos pelo preço de um.

Logo ao final do primeiro ato temos as duas meninas fugindo para dentro da floresta e realizando uma brincadeira com espíritos. Aqui, não sabemos se fica claro se a bênção afro que Angie recebeu antes de nascer é uma bênção, ou se foi uma maldição. Afinal, por que mais o demônio se interessaria por duas meninas de subúrbio americanas? Elas, então, somem por três dias e aparecem sem ter noção do tempo que ficaram fora, com o comportamento estranho e os pés queimados, o que logo é explicado pela mãe de Katty, que conjectura que as meninas estiveram no inferno.

Daí, logo o filme evolui para uma possessão completa, assim, sem nenhum tipo de drama, de evolução. Por algum motivo (falta de criatividade do senhor Green), uma enfermeira e vizinha de Angie tinha o livro de Chris Mcneil (a mãe da Regan) e ela era uma ex-noviça que largou o apostolado após ter passado por um aborto. Este livro pode ser visto no tosco O Exorcista 2, filme muito mais adequado para uma verdadeira prequela de O Devoto.

Vemos, então, atrizes do porte de Ellen Burstyn aparecerem para fazer uma ponta apenas para atrair o público antigo do filme. Chris duvida de tudo o que ela passou nos anos 70 com a sua filha, e faz pesadas críticas ao “patriarcado” – leia-se os padres Merrin e Karras, que morreram ambos para salvar Regan. Chris vai visitar Angie, que deixa claro que quer falar sobre a Regan e conhecia Chris, e a velha fica logo sozinha com Katty, já totalmente possuída, e a jovem usa um crucifixo para furar ambos os olhos de Chris.

Então, eles decidem que todas estas pessoas, Angie, Katty, o pastor da igreja de Katty, o padre (que nem tinha aparecido até começar a pedir o exorcismo), Victor, a enfermeira, os pais de Katty e, de última hora, uma mãe de santo. Eles fazem, então, uma cerimônia que mescla os rituais afro, católicos, pentecostais e protestantes tradicionais e, durante a cerimônia, o diabo que, desta vez, não é nenhum nome tirado de um grimório obscuro de demonologia, mas um demônio genérico, um demônio que deixa claro que o demônio não existe em uma conversa com a Chris, diz que uma das meninas vai morrer, e que resta a eles apenas escolher qual.

O ritual, que começa como o início de uma piada (um padre, um pastor e uma mãe de santo estão tentando fazer um exorcismo…), termina exatamente como se imagina: o padre morre, Katty morre e Angie fica livre do diabo. No fim, Linda Blair aparece apenas para fazer uma ponta da ponta e visita a sua mãe, Chris, no último minuto do filme.

Sim, o senhor Green perdeu a oportunidade de explorar mais a relação entre Regan e Chris. Ele perdeu a chance de ter Linda Blair em um novo filme do Exorcista. É uma completa pena. O primeiro filme me traumatizou, no longínquo ano de 1997, quando eu o assisti pela primeira vez, ao lançarem a versão do diretor, ainda em VHS. Foram muitas noites sem dormir, muitos sonhos com as imagens fortes e blasfêmias e, mesmo hoje, eu não consigo assistir este filme sem uma grande preparação. O Devoto, porém, já nasceu esquecido. Não só faltou Deus neste filme. Faltou o diabo. Faltou um exorcismo. Faltou terror.


Sinopse

O Exorcista – O Devoto é a sequência do clássico de 1973 sobre uma menina de 12 anos que é possuída por uma misteriosa entidade demoníaca, forçando sua mãe a buscar a ajuda de dois padres para salvá-la. Nesta versão de 2023, desde a morte de sua esposa grávida em um terremoto no Haiti, há 12 anos, Victor Fielding tem criado sua filha Angela sozinho. Mas quando Angela e sua amiga Katherine desaparecem na floresta e retornam três dias depois sem memória do que aconteceu com elas, isso desencadeia uma série de eventos que obrigará Victor a confrontar o mal e, em seu terror e desespero, buscar a única pessoa viva que testemunhou algo parecido antes: Chris MacNeil. Baseado no best-seller de William Peter Blatty.

Trailer

Mais análises

Visão geral

Subscribe
Notify of
guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments
0
Would love your thoughts, please comment.x